Interocepção: o nosso oitavo sentido sensorial

Olá a todos!

Lembram-se de que aqui no nosso site, já conversamos sobre a importância das sensações para o desenvolvimento infantil em textos informativos a respeito dos 7 sentidos sensoriais: tato, visão, audição, olfato, paladar, vestibular e propriocepção. Sim, aprendemos na escola os 5 sentidos do corpo humano, mas na verdade eles são 7! Mas isso vocês já sabiam, não é verdade? E… na verdade, sabe-se que existe o oitavo sentido.

E nesse texto, gostaríamos de falar um pouco sobre esse outro sentido pouco abordado pelos profissionais. Estudos recentes incluem um oitavo sentido conhecido por Interocepção. E, apesar de causar uma certa estranheza o nome desse sentido, vocês, com certeza, irão reconhecê-lo quando falarmos um pouco mais sobre ele, pois “o utilizamos” ao longo de nossas vidas e desde que somos bebês.

De acordo com os pesquisadores da área de Integração Sensorial e Neurobiologia, Interocepção é o canal de informação entre o corpo e o cérebro, usado para representar o que acontece dentro do nosso corpo. As sensações são onipresentes, nos acompanham diariamente e precisamos tomar consciência delas, para compreender e agir ao que se passa conosco. A interocepção é definida como o sentido que “percebe” e age sobre as sensações internas do nosso corpo, interagindo com a cognição e emoção. O alerta interoceptivo é a habilidade de NOTAR sinais no próprio corpo e conectá-los a um significado. Ou seja, o que está acontecendo dentro do nosso corpo.

Vamos dar um exemplo de sensações interoceptivas: fome, sede, controle esfincteriano, calor, frio, cansaço. As sensações fisiológicas que essas funções nos trazem, como sentir sede, sentir fome, vontade de fazer xixi, são pistas que geram um “gatilho” para reações/ações cognitivas e emocionais a favor da homeostase (equilíbrio do organismo), sensação de bem-estar e compreensão de quem nós somos. Em outras palavras, quando temos fome, sentimos algo no nosso corpo… um roncar de estômago, a sensação de um “”, de um “vazio”. Essas sensações nos alertam de que algo está errado. Quando identificamos “aaahhh é fome!”, podemos agir sobre essa dica: ficamos mais irritados, cansados ou logo pegamos algo para comer e voltar ao nosso bem-estar. A interocepção nos ajuda a compreender o funcionamento do nosso corpo e a integração dele com o ambiente.

Os bebês com fome, o que fazem? Choram! Como ainda não possuem a linguagem oral, precisam se expressar com o corpo e com o choro. O choro e a agitação corporal são linguagens preciosas e que sinalizam ao cuidador de que está acontecendo algo com o seu bebê. Na UTI Neonatal, como os prematuros recebem a dieta programada de tempos em tempos, frequentemente nem conseguem expressar que estão com fome e tampouco demonstrarem que estão satisfeitos ou que desejam mais. Essa falta de experiência de sentir fome, chorar, pedir mais e saciar-se pode, sim, interferir na maturação desse oitavo sentido. Por isso, ser tão importante o desmame da sonda e o prematuro ter a experiência do aleitamento materno, seja diretamente em sua mãe ou por outras vias.

Por mais que algumas experiências sejam importantes para todos os bebês, como, por exemplo, sentir fome/saciedade é importante lembrar que os sinais que o  corpo produz são únicos, particulares de cada um de nós e para as crianças e bebês também! O que eu sinto no meu corpo quando estou com fome ou a pista de que estou cansada, é diferente do que você sente e do que seu bebê sente…. Igualmente, aquilo que escolhemos para nos regular, nos auto-consolar, também é único.

As habilidades cognitivas e emocionais estão ligadas a Interocepção, pois quando temos consciência do que acontece com nosso corpo, podemos agir sobre ele, resolver problemas, ser mais flexíveis no pensamento e nas tomadas de decisão. Quem aqui, alguma vez sentiu tanta fome e começou a ficar irritado, rígido, sem conseguir trabalhar ou cuidar do que precisava naquele momento?

Agora, vamos pensar na Interocepção e como essas sensações podem impactar no desenvolvimento da criança pequena e no bebê? Lembrem-se que as pistas sensoriais são únicas, os registros do mundo e a forma como atuamos nele é uma constante evolução, mas também particular. Assim, como um bebê pode apreciar um balanceio mais forte no colo, ser jogado para cima; outro bebê pode ficar apavorado com esse tipo de brincadeira. E devemos respeitar.

A mesma coisa acontece com a as sensações internas… um bebê, quando tem seu intestino funcionando, pode vivenciar com muita tranquilidade todo o processo. Já outro, os sinais de que o intestino funcionou, a sensação de fazer o cocô e a sua fralda suja, podem ter um impacto maior no seu corpo e ele mostrar isso com choro, irritação e nervosismo. Isso também acontece no contexto de UTI Neonatal, com os prematuros entubados e a saturação despencar… quem já não observou isso em seu prematuro? Estava tranquilo. De repente a fralda ficou suja, começa a se agitar e a saturação despencar…

Ao nascimento, o bebê tem a pré-disposição às sensações e ações interoceptivas mas, precisa de um regulador externo que é o adulto, um cuidador. Quando ele está com fome, chora e a mãe oferece o alimento. O bebê precisa amadurecer essas sensações e as necessidades do seu corpo, bem como seguir o curso do desenvolvimento sensorial e cognitivo, conectando pistas das sensações com as ações e regulação. Os pais, com olhares atentos, também vão, pouco a pouco, aprendendo a conhecer o funcionamento sensorial dos seus filhos, as pistas interoceptivas e as ações que o ajudam a retomar a homeostase e atuo-regulação. E os papais prematuros podem observar tudo isso desde a UTI, mas no momento do pós alta em casa, poderão verificar as respostas do seu filho com muito mais minúcia.

Vamos dar um exemplo: a mãe observa que seu bebê está agitado, as mãos mexendo rapidamente e o corpo balançando, retorcendo – isso é uma pista! E a mãe se pergunta: “será que meu bebê está nervoso?”, “Irritado?”, “Com sono?” – Isso é a expressão pelas emoções! Agora a mãe o pega no colo, abraça oferecendo maior pressão no corpo, balança devagarinho para acalmá-lo… Isso é uma ação! Que por enquanto é externa e precisa de um adulto… ao longo da vida, espera-se que a criança vai buscando suas soluções a partir das sensações internas do próprio corpo, a partir de suas próprias experiências. Por isso, ser tão importante verificar a idade corrigida de nossos prematuros para todos os aspectos do desenvolvimento. Afinal de contas, para acontecer a maturação dos sentidos são necessárias experiências ambientais, lúdicas e afetivas. E sabemos o quanto o ambiente da UTI, pelas suas próprias especificidades, não é rico em experiências organizadoras para os nossos bebês. Está ai mais um motivo vital para o incentivo do contato pele a pele e método canguru… colo de pais é a mais rica experiência afetiva e de organização neurológica para todo e qualquer prematuro.

 O mais importante em todo cenário, seja no contexto hospitalar ou domiciliar, é acompanharmos a evolução de nossos bebês e todas as demonstrações comportamentais e de VIDA que eles nos demonstram, buscando sempre oferecer conforto a eles. E, ao longo do desenvolvimento é importante perceber se nossos filhos estão tendo a consciência do funcionamento de seus corpos e das sensações do mesmo.

Portanto, para as crianças maiorzinhas, os pais já podem ajudá-la a se perceber! Converse com a sua criança sobre o funcionamento do corpo dela. Peça que sinta as batidas do coração antes e depois de uma brincadeira de corrida ou de bicicleta. Que ouça e sinta a sua respiração. O que é estar ofegante? Como faz para respirar fundo? O que muda no nosso corpo e no comportamento quando fazemos isso?

E antes e depois de beber um copo de água? A garganta estava seca? E depois de tomar a água ou suco? Como ficou? É bem divertido e importante ajudar seu filho o ouvir suas pistas internas, conhecer o funcionamento interno do próprio corpo e adquirir o autoconhecimento.

Afinal de contas, as sensações são um mundo de possibilidades para o desenvolvimento humano e para as relações afetivas. Conhecê-las pode impactar de forma muito positiva na interação do seu bebê e criança com o mundo, com as pessoas e com ele mesmo!

Está aí o nosso oitavo sentido. Espero que tenham gostado dessas informações escritas pelas terapeutas ocupacionais e mães Ana Luiza Andreotti e Teresa Ruas.

Referências:

Koscinski, Cara. Interoception: How I feel.

Mahler, Kelly. Interoception: the eighth sensory system.

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