A sua casa tem sido um laboratório para o mundo?

Olá a todos!

Como vocês já sabem, Teresa e eu estivemos em Encontros sobre a Infância e o seu Desenvolvimento na semana que passou com a presença de familiares em ambos os eventos.

No TEAbraço (@jujuba.autismo) em Ribeirão Preto, foi uma semana de trocas de experiências entre familiares e profissionais de alguns centros de Autismo que são referência nos EUA (ELS Institute, Changing Behavior, NACS, NBI).

Algumas palestras destacaram-se nesses dias do evento e compartilho com vocês alguns assuntos que julgamos interessante para refletirmos como pais, família e profissionais que lidam, diariamente, com crianças que expressam outras características e comportamentos no campo do desenvolvimento e aprendizagem infantil.

O primeiro foi sobre pesquisas e exames em Genética no Brasil. Além da equipe do Hospital das Clínicas em São Paulo, outro grupo com atuação expressiva nessa área e que estava no Encontro foi o da TIMOO (www.timoo.com.br). Esse grupo de pesquisadores apresentou novidades em pesquisas genéticas que estão sendo realizadas no Brasil e o aprimoramento dos exames e diagnósticos genéticos nos últimos anos. Um dado importante enfatizado em suas palestras foi da importância do Aconselhamento Genético.  O aconselhamento é indicado para as famílias que possuem filhos com alguma alteração genética e é realizado por um Médico Geneticista. A consulta consiste na discussão do diagnóstico da criança com a família, o estudo da probabilidade de ocorrer a mesma ou outras condições genéticas para o próximo filho, orientações sobre uso ou não de condutas farmacológicas para a criança, bem como indicação de terapias personalizadas ao longo da vida. O Aconselhamento Genético dentro de uma equipe interdisciplinar é comum nos EUA e tem se mostrado fundamental para que os pais possam receber orientações sobre quais e o porquê da indicação de exames, bem como as terapias farmacológicas e convencionais que serão indicadas de forma personalizada para cada criança, de acordo com seu histórico e contexto familiar.

Outra palestra que destacamos foi a da Psicóloga Clínica, PhD Celine Saulnier (www.nacs.com), que falou sobre a autonomia e independência das nossas crianças.

Foi bem interessante ouvir o olhar dessa profissional sobre esse tema no autismo, mas ela também trouxe a reflexão para as crianças de uma forma geral dentro do processo de desenvolvimento. Ela nos chamou atenção sobre o equilíbrio que devemos exercer entre a proteção excessiva que realizamos e a segurança que precisamos proporcionar como pais. Muitas vezes, por nossos filhos apresentarem alguma condição de saúde ou do desenvolvimento ou até mesmo pela nossa rotina intensa de vida, acabamos fazendo atividades em casa por eles, não permitindo que nossos filhos as aprendam, que aprimorem suas habilidades e que possam ter mais autonomia.

Esse comportamento de proteção excessiva pode estar muito presente também no momento do pós alta de nossos prematuros e ao longo dos primeiros anos de nossos guerreiros. Eles apresentam características clínicas específicas que requerem aos pais outros manejos no dia a dia, como, por exemplo, evitar visitas, não ter contato com crianças gripadas, evitar ambientes fechados, não sair em dias muito frios, antecipar a entrada na escola, entre outras questões. Para muitos, nós pais de prematuros somos ¨taxados” como superprotetores, mas diante do contexto e situação clínica que essas crianças apresentam, a superproteção pode ser positiva ao impedir o adoecimento e/ ou reinternação de nossos pequenos. E ao longo do crescimento e desenvolvimento de nossos filhos, vamos, aos poucos, aprendendo a diminuir nossa superproteção.

Diante desse contexto, a Dra. Celine nos propôs um exercício de nos perguntar a seguinte frase:

Seu filho é capaz de escovar os dentes sozinho?” Dependendo da idade, se ele tem mais de 6 ou 7 anos, você vai certamente responder: “Sim, ele é capaz…claro…”

Mas a pergunta correta que vem em seguida é: “O seu filho escova os dentes sozinho no dia a dia?” E escovar os dentes sozinho implica ele ter a iniciativa para tal habilidade, pois sabe qual o momento que deve fazer essa atividade e executar a tarefa propriamente dita. Ou, no dia a dia, nós pais precisamos lembrá-lo, levá-lo até o banheiro, ajudar a organizar seus pertences, fazer uma supervisão, etc.?

A escovação é um pequeno exemplo, mas podemos extrapolar para atividades como arrumar a mochila para escola, comer, servir-se de água, arrumar a mochila para passar a tarde na casa de um amiguinho, organizar e guardar seus brinquedos…

Nós acabamos fazendo pequenas coisas para nossos filhos como forma de “proteção”, mas impedimos na verdade que eles cresçam, amadureçam no cotidiano, nas “pequenas” ações que eles já são capazes de fazer para o mundo.

Foi muito interessante refletir sobre isso e nós aconselhamos a todos os pais a repensarem a sua rotina com as crianças e o quanto estamos proporcionando que a nossa casa seja de fato um laboratório para o mundo ou uma redoma de superproteção. Eu, mesma- Teresa Ruas-, diante dessa reflexão percebi o quanto ainda carrego a superproteção excessiva com Maitê Maria, a minha primeira filha, nascida de 23 semanas e 1 dia. Ainda carrego grandes marcas da prematuridade extrema e, claramente, subestimo a real potência e capacidade da minha filha. Sinto me um pouco culpada, porém sei que faço o meu melhor todos os dias e que, a cada dia, tenho a oportunidade de aprender e transformar as minhas preocupações com o desenvolvimento e aprendizagem de minha filha em reais possibilidades para ela e eu enxergarmos, Maitê, como uma menina que já tem quase 7 anos de idade. De fato, é um aprendizado difícil, mas necessário para toda a família.

Continuando a reflexão…. pergunte-se de vez em quando: “meu filho é capaz de: ….” mas, principalmente reflita: “ele faz?” As respostas das pessoas na platéia foram bem interessantes…em maioria, resguardando as proporções de idade, as crianças eram sim capazes de realizar pequenas atividades do cotidiano, mas dificilmente os pais responderam “sim, ele faz”. Ana Luiza e Teresa Ruas mais uma vez se incluiram nesse grupo… Somos mães, antes de termos qualquer outro papel ou função… e exatamente por isso, o fato de estarmos nesse grupo não cabe julgamentos e, sim, reflexões para proporcionarmos o melhor para nossos filhos e família.

A Psicóloga Clínica Katia Morritz, também PhD em comportamento (www.nbiweston.com), palestrou sobre como nós pais devemos agir em algumas situações quando a criança apresenta uma história de complicações clínicas ou uma condição de diagnóstico como o Autismo, Síndromes, etc. Assim como a Dra Celine, ela nos falou da importância de exercitar autonomia em casa e como podemos pensar em regular a proteção para oferecer segurança para nossos filhos, mas ao mesmo tempo, não privá-los dos seus fracassos e de suas “experiências dolorosas”. Se não permitirmos que nossos filhos tenham experiências negativas, eles não aprenderão o que fazer com esses sentimentos e o que fazer diante desses desafios que a vida impõe em diferentes contextos e fases da vida. Como sair de uma situação e resolver um problema se eu nunca o vivenciei? Os momentos na vida dos nossos filhos podem ser bons ou ruins, mas são igualmente significativos. Outra questão tão importante, mas tão difícil para exercitarmos no dia a dia, não é mesmo? Ainda mais quando os nossos filhos apresentam complicações, dificuldades, diagnósticos. Mais uma vez, aqui não cabe nenhum tipo de julgamento e, sim, reflexões sobre a nossa conduta como pais, diante da real condição de nossos filhos.

Outro assunto que para nós, pais e profissionais, pode ser difícil de enfrentar e que a Dra Katia falou lindamente, foi da importância de se contar o diagnóstico para a criança que o tem. Ela falou abertamente com as famílias da importância de contar para o filho o que ele tem, seja Autismo, Síndrome de Down, Paralisia Cerebral, Dislexia, etc e, principalmente, a sua história. Buscar ajuda de profissionais para orientar em como dizer e explicar para seu filho sua história clínica, de vida e experiências dolorosas que ele passou pode ser necessário. Essas informações com certeza vão preencher questões de vida que muitas vezes a criança e o jovem tem e que não percebemos, tais como:“Por que sou assim?” “Por que tenho dificuldade para aprender na escola?” “Por que eu falo assim?” “Por que não jogo bola tão bem?”

Não existe uma idade certa para contar ou uma forma melhor…o ideal é sempre pedir ajuda de um profissional e vocês juntos, pais, vão saber o momento de contar, pois depende das habilidades cognitivas de compreensão que seu filho tem, da condição emocional, da maturidade e contexto familiar que variam entre as pessoas.  Mas procure dizer ao seu filho o que ele tem e o por quê ele “funciona” dessa maneira. E que, assim como ele, existem tantas outras crianças e pessoas na mesma condição. Falar sobre o diagnóstico com a criança é verdadeiro, é amor, é ético. Compartilhar com ele sua própria história, fará diferença sobre o que ele pensa de si mesmo, dos outros e o que ele fará com tudo isso no futuro. Cada criança tem seu tempo e habilidades cognitivas para compreender e devemos respeitar isso também.

Espero que essas poucas informações proporcionem momentos de reflexão em família e, que de alguma forma, possam ajudar a pensar estratégias e condutas a favor do desenvolvimento dos nossos filhos. E sempre, sem julgamentos… não existe a forma melhor ou pior de educarmos, criarmos e potencializarmos os nossos filhos. Antes de tudo, existe um coração de mãe, um coração de pai que deseja o melhor para cada um dos filhos. O amor, com certeza, é o melhor caminho para guiar as nossas reflexões, dúvidas, angústias e incertezas… portanto, primeiramente, sinta o seu coração!

Um grande abraço, Ana Luiza e Teresa

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