A idade entre 2/3 anos é a clássica época dos choros descontrolados, dos gritos/ berros e daqueles chiliques em público, nos quais todos ao redor escutam e devem pensar bem no íntimo: “nossa que criança sem educação”!
A boa notícia é que estes comportamentos que deixam os pais e/ou principais cuidadores à flor da pele tem uma fase de ápice e após, tendem a se tornar menos intensos. Aqui em casa, a exaustão emocional diante das birras do Lucca de 2 anos e 4 meses está tão presente em quase todos os finais das tardes e inícios das noites, que às vezes tendo a duvidar dessa linda teoria que afirma que o comportamento da birra passará.
Lucca é o segundo filho. Muito mais intenso do que Maitê Maria, minha primeira filha. Comparando os dois na clássica idade da birra, Lucca passa pelo primeiro lugar infinitas vezes e sem nenhuma chance para o segundo turno. Ganha com milhões de episódios de birra à frente da irmã já no primeiro turno.
Esses dias me peguei pensando e refletindo em como os filhos podem ser tão diferentes e distintos, mesmo tendo os mesmos pais. Claro que cada filho nasce em momentos diferentes de nossas vidas e isso interfere em nossa relação diária com eles. Não estava refletindo sobre as nossas diferentes fases da vida e possíveis amadurecimentos e transformações sofridas entre um filho e outro. Até porque que bom que somos seres humanos e que estamos em constante transformação.
Voltando às minhas reflexões… estava mesmo encafifada como os filhos podem ter personalidades, características e necessidades tão diferentes. Eu sei o quanto isso é positivo, autêntico, potente e necessário. Graças a deus as pessoas são distintas entre si. Lindeza da diversidade humana, mas… em muitos momentos, sinônimo de cabelos em pé para nós mães e pais.
Não tenho vergonha alguma em afirmar que fico de cabelo em pé e exausta emocionante diante dessa diversidade entre os meus filhos. Enquanto um, com um simples olhar de reprovação diante do mal comportamento, já se adequa às normas culturais de não ser muito usual comer macarrão com caca de nariz, o outro debocha e cai na risada, diante do meu mesmíssimo olhar de reprovação.
Para esse outro filho, o olhar de reprovação precisa dar lugar a um diálogo sobre o motivo de não comermos caca de nariz com a comida. Resultado: mais caca de nariz no prato. Vou então para a terceira estratégia: um grito de uma mãe já cansada às 19 horas da noite. Resultado: risos na platéia e a filha mais velha lembrando a mãe que nada se resolve com gritos! E como se não bastasse a angústia instantânea produzida em minha alma, diante de um comentário verídico sobre a eficácia educacional e emocional do grito, vindo de uma criança de 5 anos, ainda escutei da mesma pessoinha que eu deveria saber que bebês são bebês e que não se comportam como crianças maiores como ela.
Poderia até prolongar o post com a 4a , 5a, 6a estratégias utilizadas nesse dia… mas como nada funcionou, até eu tirar o mais novo da mesa…utilizei essa cena foi mesmo para demonstrar o quanto as diferenças entre os filhos são potentes, mas o quanto essas mesmas diferenças nos exigem muito em nosso dia a dia. Ou seja, para um, falar mais ríspido é necessário, para o outro, um simples olhar já funciona. Para um, o grito não significa nada, para o outro, pode ser sinônimo de choro e de muita tristeza. Para um, ficar sem o brinquedo predileto produz muitas marcas, para o outro, tudo bem… porque se dirigir ao quarto e pegar um outro brinquedo atrativo é tarefa fácil.
Ue, Tetê? Você não sabia que seria assim? Bem você que sempre estudou sobre as diferentes características das crianças pequenas?
Não tinha a menor idéia que em uma mesma cena de acontecimentos teria que, no mesmo minuto, ser de um jeito com um e ser oposta com o outro. Na prática diária isso exaure. Pode ser lindo ver as diferentes personalidades, mas no dia a dia, lidar com isso a todo tempo está me deixando de cabelos em pé. Fiquei até mais consolada ao ler uma matéria da revista Pais e Filhos sobre o trabalho triplicado que o segundo filho gera. Corri e compartilhei no face. Em poucos segundos, mães de 2 afirmavam o que estavam lendo. Ufffaaa! Não estava sozinha nessa missão diária de 24 horas que se repete todos os dias.
Aqui em casa está sendo um mantra eu ler e reler sobre posts que eu mesma escrevi ( risos) sobre a fase de birras no segundo e terceiros anos de vida. Inclusive esse era o tema inicial desse post…
O fato é que apesar das crianças terem personalidades, necessidades e comportamentos distintos entre si, características em comum ocorrem ao longo de todo desenvolvimento infantil, com maior ou menor freqüência e duração. A birra é um desses comportamentos clássicos nos primeiros anos de vida, assim como as mordidas também podem ser.
A criança pequena ainda não adquiriu a capacidade de se colocar no lugar e/ou na perspectiva do outro e nem perceber “concretamente” que os outros, assim como ela, têm desejos, vontades e que uma grande parte desses sentimentos não será “alcançada”, pois existem regras, normas e valores a serem seguidos dentro de um contexto e/ou demanda social/ambiental.
Além disso, diante de tantas aquisições importantes que a criança já conseguiu- correr, pular, andar, falar palavras/ frases, finalizar uma atividade sozinha, entre outras habilidades- ela se sente “toda poderosa” e a “grande exploradora de todas as possibilidades”, só que ainda, como disse anteriormente, sem a capacidade emocional de se colocar no lugar do outro e sem o entendimento real da importância dos limites para todo ser humano.
Portanto, um simples “não” e/ou uma pequena frustração pode desencadear aquele chororô descontrolado e aquele chilique, acompanhados por chutes, arremessos de objetos, tapas e/ou outros comportamentos. As famosas mordidas, especialmente entre os coleguinhas da escola, podem acontecer também nessa mesma cena.
Imaginem uma criança pequena que ainda não tem o domínio da linguagem oral em um “diálogo” com o seu coleguinha que está a todo momento querendo pegar o mesmo brinquedo desejado… como será que seria esse ¨diálogo ¨? Com palavras? Com o corpo?
A resposta correta para essa pergunta é que mesmo que a criança consiga ter um ¨diálogo ¨ com algumas palavrinhas, o embate é vencido mesmo com o corpo. Crianças pequenas usam o corpo como a extensão do seu próprio eu, dos seus próprios desejos e intuitos. Dar uma mordida significa sim usar o corpo para se comunicar, com uma linguagem bem clara e dolorida para quem dá e para quem recebe.
Sim! Podem acreditar. Dar a mordida pode ser tão dolorido como recebe- la. A dor é também tamanha para a mãe da criança que mordeu, como para a da criança que recebeu. Por isso, julgar é o caminho menos eficaz. Compreender o que sucedeu no cenário escolar e como podemos acolher e acompanhar o desenvolvimento infantil nos primeiros anos de vida é a melhor solução.
Eu sei que está textão, mas gostaria de enumerar algumas alternativas diante de situações estressantes ou inesperadas como um ataque de birra ou uma mordida. Vale lembrarmos de que a boa teoria/ estratégia é aquela que funciona com os nossos filhos. E que a estratégia que funciona em casa, não é, necessariamente, a que funciona na escola. Cada ambiente tem as suas particularidades e isso interfere, diretamente, na forma como os nossos pequenos se comportam.
1- RESPIRAR FUNDO e tentar manter a calma. Devemos nos lembrar, incluso EU, que por mais difícil que pareça, que a criança está em pleno desenvolvimento e necessita que alguém signifique e explique as consequências de seus atos.
2- Esperar o nervosismo passar e a criança se acalmar é muito importante. Tentar explicar e/ou dialogar no ápice da agitação e do nervosismo não é o melhor caminho. Se estivermos em local público e não tivermos “estômago e/ou cabeça” para esperarmos, a melhor alternativa é voltarmos para o carro. Se não existir nenhuma possibilidade de diálogo/conversa/trato entre nós- pais e criança, voltarmos para a casa é uma grande solução, além de ser um grande sinalizador para a criança que os atos de birra INCONTROLÁVEIS sempre têm as consequências.
Ainda estou a mil anos luz atras desse segundo ponto em esperar o nervosismo passar. Quando vejo, já estou gritando, berrando… assim como em um ataque de fúria de mãe (risos).
Da mesma forma que é importante entender a frustração da criança/ significar os seus sentimentos, é importante também demonstrar o quanto o papai e a mamãe não ficaram satisfeitos com aquele comportamento/situação. Sermos objetivos e claros é o melhor caminho.
Aqui também estou a mil anos luz atras… sou extremamente prolixa e nada clara. Ainda bem que meu marido tem uma cabeça de engenheiro, na qual funciona com poucas palavras. Na minha casa, o engenheiro tem salvado a terapeuta infantil de várias ciladas (risos).
3- SONO, FOME, estímulos ambientais em excesso, cansaço e/ou agitação. Estas situações são um gatilho para o início de uma clássica e incontrolável birra. Aqui, a prevenção é o melhor caminho. Nós teremos que respeitar estas condições e possibilitar que a criança sacie a sua necessidade.
Aqui em casa FOME e SONO no pequeno costumam acordar o gigante da BIRRA.
4- Grande agitação e/ou nervosismo e achamos que não é nenhum dos fatores acima citados, nada como um abraço bem gostoso e/ou uma mudança de foco- mostrar algo interessante para a criança, dar um rápido passeio, contar uma história- não possa resolver a situação e minar o comportamento da birra.
Aqui em casa o 4a aspecto está bem longe da prática. Sabe aquela teoria linda que para o meu caçula não funciona? É bem essa quarta. O meu abraço dá mesmo o lugar de deixar ele chorar sozinho e eu voltar quando ele estiver mais calmo. Somente após se acalmar é que eu e Lucca conseguimos nos abraçar.
5- Não nos incomodarmos com que as pessoas pensam e/ou deixam de pensar quando ocorrem estas situações em locais públicos é um grande caminho para mantermos a nossa a saúde mental. Comparações com outras crianças e outras culturas também não precisam ser feitas. Cada família tem a sua conduta, os seus valores e as suas convicções. Pais que ficam comparando os seus filhos com outras crianças tendem a ter mais estresse e menos confiança em seus atos. Portanto, confiar na educação e no amor que estamos dando aos nossos filhos é também essencial para enfrentar essa fase clássica da birra, da mordida e tão normal em qualquer desenvolvimento infantil.
Espero que tenham gostado das confissões de uma mãe que está diariamente aprendendo com os seus erros, acertos e infinitas tentativas. Afinal de contas, li uma frase na escola dos meus filhos que diz: viver bem é diferente de viver melhor. Se as respostas já estão todas dadas, onde está o lugar das perguntas e dúvidas?
Um grande abraço, Teresa Ruas, mãe de Maitê Maria e Lucca, Terapeuta ocupacional, Especialista em Desenvolvimento Infantil, Consultora sobre Desenvolvimento Infantil e Inclusão Escolar, Mestre em Educação Especial, Doutora em Ciências da Saúde com enfoque na saúde coletiva infantil e autora do livro prematuridade extrema: experiências e olhares da editora Manolle.