As crianças prematuras que passaram por algumas experiências negativas ao nascimento, como, intubação, uso de sondas de alimentação, aspirações frequentes de vias aéreas superiores, manipulações frequentes por toda a equipe médica e de enfermagem, perdem o prazer de associar o corpo e a boca com um estímulo prazeroso.
Vamos pensar no bebê que nasceu a termo, sem intercorrências, ele logo é colocado no colo da mãe e é acolhido com amor. Esses bebês passam por experiências prazerosas do sistema tátil global e oral ao contato com o corpo da mãe e início do sugar ao seio, de forma muito positiva e agradável. Entretanto, para algumas crianças prematuras, o início da alimentação é marcado por muitas dificuldades desde o início da alimentação após o nascimento e depois com a introdução da alimentação complementar. Elas podem apresentar dificuldades alimentares, como a seletividade alimentar e recusa alimentar.
A seletividade é descrita quando a criança consome menos de 20 alimentos, sem adicionar outros, não aceita e não come os mesmos alimentos da família, evita alimentos inteiros de grupos (proteínas, vegetais, etc), possuem preferência de uma mesma consistência alimentar ou cor e não tem interesse na situação de alimentação, se mostram tristes com outros alimentos. As crianças que exibem o quadro de recusa alimentar, emergem depois de uma experiência negativa (doença, trauma, engasgo), medo e ansiedade sobre o alimento, geralmente ocorre com a seletividade alimentar.
Muitas dessas crianças podem apresentar quadros de alterações de integração sensorial, ou seja, o cérebro não discrimina ou interpreta essa informação bem (o contato com os alimentos) e a criança tenta lutar ou não deseja passar por essa experiência, como a hiperresponsividade tátil (não toleram o contato dos alimentos e brinquedos com as mãos, face e boca). Elas também podem apresentar aumento das respostas de sensibilidade intra-oral (recusam alimentos e não aceitam brincar com objetos de diferentes texturas com a boca para explorar, morder), além de outras aéreas mais sensitivas como mãos e sola dos pés.
Uma orientação muito importante para os pais é oferecer a essas crianças oportunidades de brincar e explorar os objetos (mordedores, brinquedos, panos e futuramente alimentos) de diferentes texturas com a boca. Estimular a introdução de diferentes sabores enquanto a criança brinca com objetos e/ou dedos em sua boca corresponde uma estratégia importante para aquelas que apresentam alterações sensoriais. As crianças prematuras precisam passar pela experiência positiva e prazerosa com alimentação e esse momento deve ser estimulado com muito amor, respeitando sempre o limite de cada criança.
Na visualização de qualquer dificuldade alimentar, converse com o seu pediatra, o encaminhamento para uma avaliação com profissionais especializados, como o fonoaudiólogo e a terapeuta ocupacional, se tornam imprescindível visando a organização sensorial desses estímulos que tanto interferem na eficiência da alimentação.
Um grande abraço, Carla Pagliaro
Carla Lucchi Pagliaro é fonoaudióloga, graduada em Fonoaudiologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Tem formação no Conceito Neuroevolutivo Bobath. Mestre e Doutoranda em Ciências da Reabilitação pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo USP-SP. Tem experiência clínica e hospitalar há 14 anos em neonatologia e pediatria, nas áreas de motricidade orofacial, amamentação, transtornos alimentares e linguagem. Autora do capítulo de livro sobre causas da disfagia: alterações no neonato e na criança e de artigo científico sobre dificuldades de transição alimentar em crianças prematuras. Possui participação do Mealtime Partners: Workshop- Becoming a Mealtime Partner- New Vision- ministrado pela Suzanne E. Morris, nos EUA. Ministrante de palestras em congressos e cursos sobre problemas alimentares na população pediátrica.