Olá a todos. É com uma imensa alegria e orgulho que nosso site, em parceria com a Mamãe Giraffa, inicia a Semana Mundial de Amamentação de 2019 com um relato emocionante de Gabriela Leite, mãe de Elisa que nasceu prematura extrema com 26 semanas gestacionais.
Toda a nossa equipe, juntamente com o da Mamãe Giraffa, esperamos que relatos como esse possam fortalecer as mães que estejam vivenciando, nesse momento, todas as dificuldades de uma UTI Neonatal, frente à dura realidade da amamentação e do aleitamento materno. É possível realizar a amamentação exclusiva em um prematuro extremo? Confira o relato abaixo:
Minha História de Aleitamento Materno, por Gabriela Leite
Maior do que o enorme desafio de escrever sobre minha história de prematuridade é o privilégio de poder escrever sobre isso! Compartilhar a nossa experiência, saber que ela pode fazer sentido e ajudar a outros nos dá uma compreensão mais profunda de tudo que passamos e vivemos!
Nessa Semana Mundial de Amamentação, que se inicia hoje e finaliza no dia 07 de agosto, as minhas queridas amigas Teresa Ruas (aquela que me deu o meu primeiro e mais importante abraço dentro da UTI Neonatal) e Ely (enfermeira neonatal e verdadeira mãe da minha pequena durante meses) me deram a oportunidade de escrever da minha experiência com o aleitamento materno dentro do contexto da prematuridade!
Primeiramente, quero me apresentar. Sou Gabriela, 35 anos, advogada e mãe da Elisa, uma coisa deliciosa, que atualmente tem 6 anos de idade!
A história da minha gravidez é de “caos” desde o momento da descoberta! A palavra caos está entre aspas porque não há nenhum tipo de arrependimento quanto a gestação de risco, nenhuma conotação pejorativa, mas apenas para descrever uma bagunça generalizada… mas esses detalhes terão que ficar para um outro convite das minhas queridas amigas!
O fato é que, depois de descobrir a gravidez na mesma semana em que eu e meu marido perdemos o emprego, ter tendinite gestacional que me fez ter que ficar com ambos os braços imobilizados, entre outros detalhes emocionantes, com 20 semanas de gravidez, durante o 2o exame morfológico descobrimos que meu colo do útero estava com menos de 0,5cm (quando deveria estar com pelo menos 4cm). Resultado? Incompetência Ístimo Cervical (IIC),repouso absoluto por 6 semanas e um parto prematuro de uma bebê de 26 semanas gestacionais.
Elisa nasceu muito bem para a idade gestacional, 990 gramas e 35 centímetros! Ela era tão bochechuda que a Teresa a chamava de fofolete, lembrando daquelas bonequinhas da nossa infância. Até escolhi uma foto dela com 15 dias para vocês entenderem o que a Teresa queria dizer… Uma magrelinha com lindas bochechas!
MINHA FOFOLETE
A própria Ely foi a enfermeira que a recebeu na UTI Neonatal pela primeira vez. Conheceu minha filha antes de mim mesma… que privilégio ter sido ela! Usou laços de todas as cores e formatos, além do carinho de uma mãe verdadeira.
Eu, por outro lado, tive outras complicações… na hora do parto, descobriram que eu tinha acretismo placentário e tive que passar por uma cirurgia na sequência do meu parto que tinha sido normal.
No outro dia pela manhã ainda não pude conhecer minha filha, tive que passar por mais uma série de exames em que detectaram que uma parte importante da placenta ainda tinha ficado retida no útero… somente a noite é que eu pude vê-la pela primeira vez… que alegria, que dor, que sofrimento… assim, tudo ao mesmo tempo! Passei mal e as enfermeiras tiveram que me ajudar…
No dia seguinte, pela manhã, fui a UTI Neo novamente. Dessa vez mais calma e preparada, uma enxurrada de informações sobre a saúde da Elisa, dinâmica da UTI, expectativas da longa internação pela frente e mais um monte de informações sobre o aleitamento materno!
Primeiramente, os médicos me explicaram a importância do aleitamento para os prematuros, em especial pelos anticorpos e confesso que é tudo que me lembro desse momento.
As enfermeiras me explicaram que tínhamos um banco de leite a nossa disposição e que eu deveria “ordenhar” (eu ri…) de 5 a 6 vezes por dia, que deveria comprar7alugar uma máquina para depois da alta ordenhar (eu ri por vezes e vezes ate me acostumar com o termo) também em casa…
Uma nutricionista me explicou sobre como minha alimentação impactaria na minha pequena! Coma isso, evite aquilo… Quantas informações para uma cabeça confusa!
Lembro-me com detalhes da minha primeira ida ao banco de leite… não queria ir pra lá, queria ficar com a minha bebê todo tempo disponível (ainda estava fazendo muito exames e medicamentos intravenosos que me mantinham bastante tempo no meu quarto e longe da Elisa). Mas, tinham embutido em mim o conceito de que aquilo era o melhor que eu podia dar para a minha bebê!
Tira roupa (aliás, acho que isso é uma das coisas que a mãe de prematuro mais faz – banco de leite, canguru… é um tira e põe sem fim), põe touca, lava as mãos, pega o kit, senta na máquina… como será que funciona? Olha de canto de olho pra ver como as outras estão fazendo… que constrangimento! A pessoa responsável veio me ajudar, me explicou como fazer e me disse carinhosamente que demandava paciência e perseverança… o leite não sai, não sai, não sai, umas poucas gotinhas, não sai, não sai… olha de canto de olho, as outras mães com uma mamadeira cheia… a pessoa responsável me conforta “tem que ter paciência, seu leite vai descer, insista!”.
Primeira ordenha, segunda, terceira, lá vai primeiro dia, segundo dia, terceiro dia: leite não sai, não sai, umas gotinhas, outras gotinhas, não sai, não sai… olha de canto de olho, mamadeiras cheias! “Tem que ter paciência, vou te ajudar fazendo algumas massagens, não desista”. Uma mulher que você mal conhece começa a massagear seus seios… que constrangimento!
Essa foi minha história inicial de aleitamento materno. No meu melhor dia, conseguia somar em todas as ordenhas do dia 30ml de leite! Se fossem coletadas as lágrimas que eu derramava a cada ordenha, com certeza, somariam bem mais do que o meu recorde de 30 ml de leite. Chorava muito naquelas máquinas, escondida e em silêncio, ouvindo as outras mães pedindo outra mamadeira porque já tinham enchido a primeira! Orava a Deus pedindo força e ajuda porque tinham me dito que o leite materno era muito importante para minha filha!
Um dos médicos me chamou para conversar… ele era um médico mais duro, conhecido por não ser muito jeitoso com as mães, confesso que fui com medo! Minha bebê estava com o intestino muito preso, então o médico veio me explicar da importância do leite materno para a minha bebê. Senti uma imensa frustração! Expliquei que eu estava fazendo as ordenhas nos horários certos e bem aplicada, mas que meu leite simplesmente não saia… ele me questionou se eu tinha feito redução de seios, se eu tinha tido algum problema nos seios no passado e completou: “moça tão nova, não tem porque não conseguir…”. Senti-me totalmente quebrada por dentro! Senti-me culpada e com uma vontade enorme de chorar! Mas, em seguida, me disse carinhosamente que eu continuasse porque o mínimo de leite materno que pudesse dar pra minha filha seria de extrema importância – mais uma vez os anticorpos e toda a riqueza nutricional que o leite apresenta para evitar danos importantes para o prematuro, tais como a enterecolite necrosante, diante da imaturidade do trato grastointestinal.
Não sai, não sai, não sai, umas gotinhas… continuamos na mesma dinâmica dura e sofrida de mais lágrimas do que gotas de leite a cada ordenha! Eu costumava brincar que não tinha jeito, pois eu não era vaca de leite, mas sim vaca de corte! Piadinha que nasceu dos risos da “ordenha”! Mas, eu insistia acreditando que mesmo que fosse o mínimo de leite, aquilo faria diferença pra minha filha!
Passados 20 dias do meu parto, tive que passar por uma curetagem para extrair o restante da placenta que ainda estava dentro do meu útero. Cirurgia tranquila e previsão de alta para o mesmo dia. Na noite anterior, me despedi da minha filha, expliquei que a mamãe não viria vê-la no dia seguinte, mas que logo estaria de volta! O que era pra ser simples, por uma série de razões ( preciso de muitos outros posts para explicar tudo ) se tornou uma internação de 10 dias na semi-intensiva para adultos.
Assim que meu quadro se estabilizou minimamente, as profissionais do banco de leite levaram para mim uma máquina para que eu pudesse continuar a ordenha. Explicaram que o meu leite seria descartado pela quantidade de remédios que eu estava tomando e pelas infecções que estavam fazendo a festa no meu corpo debilitado, mas que eu devia manter a ordenha para continuar os estímulos… fiz algumas vezes sozinha, em outras não aguentava tamanhas as dores de cabeça que tinha, passava meus dias semi dopada por morfina… lembro-me de algumas vezes em que as próprias enfermeiras me ajudaram na ordenha… mais gente desconhecida apalpando meus seios, mas estava tão dopada que nem constrangida fiquei…
Acabada a minha internação, de volta a UTI NEO! Que alegria imensa estar de novo perto da minha Elisa! Rotina dura, mas tudo aquilo já era rotina conhecida, o que sempre é bom, e depois de 10 dias longe da minha filha, aquilo parecia o céu!
Alguns dias depois me avisaram que Elisa começaria os treinos com fonoaudióloga para aprender a mamar. Ela já estava tendo menos quedas de saturação e estava pronta para o treino! A equipe me explicou que o bebê prematuro pode ter dificuldades de sucção, dificuldades de manter a saturação na mamada e se organizar com respiração e deglutição, por isso, seria um processo lento. Elisa, como sempre, surpreendeu a todos, passou super bem pelos treinos em sua boca, treinando a sua linguinha, pelas mamadeiras, até o dia de finalmente mamar na mamãe! E nesse contexto, surgiu várias dúvidas: “Será que terei leite? Será que vai sair? Será que será suficiente?”. A alegria, a ansiedade e o medo tomaram conta de mim!
Tira roupa da mãe e do bebê, pesa o bebê, põe no peito, Elisa suga… que delicia, que alegria, eu realmente entendi que era a mamãe da Elisa! Maior alegria ainda quando a pesaram de novo e ela tinha conseguido sugar 5ml… só quem é mãe de prematuro vai entender que mamar 5ml é uma enorme vitória ao invés de um fracasso!
Dia após dia, o volume ia aumentando e aumentando de pouquinho em pouquinho com paciência e persistência! Tudo que a bebê demandava a mamãe produzia, o verdadeiro milagre que tantas vezes pedi a Deus em meio às minhas lágrimas na ordenha no banco de leite. A vaca de corte também tinha leite!!
O dia da alta é um dia mágico! A alegria é tão grande, uma sensação de vitória incrível, misturadas com um medo lá no fundo do coração “será que está tudo bem mesmo? Será que vai segurar a saturação? O que eu vou fazer em casa sem um medidor de saturação?” Depois de 68 dias de internação, Elisa teve alta com aleitamento misto: mamava no peito o quanto desejasse e complementávamos com 30 ml de fórmula. Mais inseguranças “será que está mamando o suficiente? Como eu vou saber se mamou sem a pesagem pós mamada?”
3 dias depois fomos ao consultório da nossa pediatra, Dra. Nicole, já velha conhecida dos dias de UTI e mais uma alegria, mais uma vitória: Elisa tinha ganhado peso! Falo “nossa pediatra” porque a Dra. Nicole sempre cuidou de todos nós: principalmente da Elisa, mas de todo o emocional da mamãe também!
Seguimos com o aleitamento misto por mais 1 mês (eu acho…) até que nossa querida e sempre atenciosa, Dra. Nicole, entendeu que podíamos seguir no aleitamento materno exclusivo… insegurança e alegria! Acabaram-se as mamadeiras pra lavar e esterilizar, afinal, amamentar é prático demais!!!
Mês a mês íamos ao consultório da Dra. Nicole ( sempre tranquila e ponderada) e Elisa ganhava seu peso aos pouquinhos, mas sempre seguindo a sua curva. Como qualquer bebê prematuro extremo Elisa era um bebê pequeno e magrelinho! Várias vezes escutei: “como ela é magrinha e pequeninha” e eu respondia “você não viu nada, hoje ela já é grande e gordinha”… mas, tantas vezes me preocupei, será que meu leite não está dando conta? Mas, na sua paciência sem fim, a Dra Nicole dizia “Gabi, bebê não precisa ser gordo, se a Elisa estiver seguindo a curva dela, qualquer que seja, a gente vai considerar uma vitória!” e
completava “Deixa ela ser esbelta!”.
E assim… seguimos mês a mês, engorda um pouquinho, cresce mais um pouquinho, sempre mantendo a sua curva.
Amamentei Elisa até 1 ano e 3 meses e pensando agora, não sei ao certo porque parei nessa época… talvez estivesse um pouco cansada, talvez tenha dado ouvidos a algumas opiniões como “se não parar agora, depois será muito mais difícil”, sinceramente, não sei ao certo.
Nesse processo: (i) o apoio da minha família, em especial do meu marido que nunca questionou minha vontade e nem minha capacidade de amamentar, foi fundamental; (ii) o apoio e conscientização da equipe da UTI Neo e do banco de leite foram essenciais; (iii) a sabedoria e tranquilidade da Dra Nicole no processo de aleitamento e ganho de peso foram primordiais. A eles toda a minha gratidão e amor. Agradeço demais a Deus pela vida e dedicação dessas pessoas!
MEU MARIDO, MEU PRINCIPAL APOIO
O fato é que a amamentação pra mim foi uma montanha russa de emoções, mas com um final mais do que feliz e prazeroso! E espero que o meu verdadeiro e afetuoso relato possa servir de acolhimento afetivo, persistência e força para muitas mães de prematuros no contexto atual de aleitamento materno.