Olá a todos! Segue um novo post na Coluna Vida de Prematuro da Revista Crescer sobre as características imunológicas de um prematuro. Em tempos de coronavírus e quase a sazonalidade para o vírus da bronquiolite, a leitura é muito válida. Segue o link completo da revista: https://revistacrescer.globo.com/Colunistas/Teresa-Ruas-Vida-de-Prematuro/noticia/2020/02/os-cuidados-com-o-sistema-imunologico-de-um-prematuro.html
¨Um dos cuidados especiais que toda família de prematuros enfrenta é a restrição das visitas em casa. E essa restrição não significa uma superproteção dos pais ou neurose de mãe de UTI Neonatal traumatizada. Ela é necessária, sendo umas das primeiras orientações médicas na alta hospitalar, mesmo que a criança não tenha apresentado nenhum problema mais sério provindo da prematuridade.
É importante frisar que o sistema imunológico de toda criança é parcialmente imaturo até os 4 primeiros anos de idade, desenvolvendo- se até completar a sua maturidade no período da pré-adolescência, por volta dos 12 anos de idade. Portanto, especialmente nos primeiros anos de vida de todo bebê, a imunidade ainda é muito baixa, o que requer um cuidado especial por parte de todos os pais. Se o sistema imunológico é imaturo em todos os bebês, mesmo os que nasceram a termo e sem nenhuma complicação clínica, o dos prematuros também será, mas com uma maior imaturidade, quando comparados com os a termo, correto?
Essa característica acontece, pois o prematuro recebeu parcialmente da mãe os anticorpos/ células de defesa, chamadas de imunoglobulinas. Elas são importantes para combaterem e atuarem nas infecções e reinfecções virais e bacterianas, sendo que o maior aporte de defesas do organismo acontece nas últimas quatro semanas de gestação, período em que os prematuros, frequentemente, já não estão mais no útero materno.
Além disso, é muito comum o recebimento de antibióticos em longos e variados períodos da internação em uma UTI Neonatal. Antibióticos agridem os micro- organismos que colonizam o organismo e que possuem uma grande função de defesa contra os agentes agressores. 3,4Somado a isso, verifica-se com frequência, que os prematuros, especialmente os extremos, não irão receber o colostro em seus primeiros dias de vida e poderão receber o leite materno de forma mais tardia. O colostro é considerado a primeira vacina que todo bebê recebe por conter células de defesa importantes para a proteção do organismo. E o aleitamento materno é de fundamental importância para a promoção da maturação do sistema imunológico de toda criança em seus primeiros anos de vida, especialmente para os prematuros.
Dessa forma, diante de todo um quadro clínico e fisiológico de um prematuro e que difere muito de um a termo, os cuidados normais que devem acontecer para todo bebê nos primeiros meses de vida quanto à restrição de visitas, entrada em uma escolinha, passeios em ambientes fechados, com grande aglomeração e ações de higienização das mãos, brinquedos e ambiente domiciliar terão que acontecer por um período muito maior de tempo e com uma outra qualidade.
Visitas em casa após a alta hospitalar precisa ser restrita porque as pessoas podem transmitir vírus que, para uma criança com uma baixa imunidade, pode provocar infecções graves e ocorrer o retorno ao ambiente hospitalar. Algumas infecções virais, como uma gripe em adultos, podem até mesmo acontecer sem grandes sintomas ou até mesmo passarem despercebidas. Mas esse mesmo vírus que ocasionou algo sem menor importância no adulto pode provocar infecções muito graves em prematuros, tais como a tão temida e traumática bronquiolite.
Pais de prematuros que passaram por um período de longa internação e que possuem filhos com broncodisplasia – doença pulmonar crônica- ou problemas cardíacos temem a mínima possibilidade de seus bebês contraírem qualquer vírus respiratório, em especial o vírus sincicial respiratório, o famoso VSR. Pessoas gripadas são potenciais transmissoras desse vírus. Sabe que esse vírus pode provocar infecção no nariz, garganta, traqueia e na parte mais delicada dos pulmões, os bronquíolos, podendo causar um inchaço que estreita as vias respiratórias, tornando a respiração bem mais difícil para o bebê.
Como o grande segredo para evitar o contágio de qualquer vírus respiratóro, ou de qualquer gripe, incluindo atualmente o corona vírus, é a prevenção, o grande hábito de lavar bem as mãos com água e sabão e higienizá-las com álcool 70, antes de tocar no bebê, não é um hábito que nós pais de prematuros apresentamos por estarmos exagerando nos cuidados, proteção ou por tentarmos “ trazer “ as características de um ambiente hospitalar para a nossa casa. Antes de qualquer julgamento que, frequentemente, nós pais de prematuros recebemos das pessoas ao redor sobre a preocupação extrema com a higiene das mãos, esse simples ato pode significar a prevenção de doenças muito temidas no período pós alta hospitalar, como a bronquiolite.
Portanto, evitar ambientes fechados, aglomerados, sem ventilação necessária e o contato com crianças e adultos gripados/resfriados, tais como o ambiente de uma escolinha, restaurantes ou shoppings não significa que nós pais de prematuros realmente protegemos os nossos filhos além dos limites esperados. Significa, antes de tudo, que os pais de crianças imunodeficientes e que tem características clínicas distintas dos a termos, compreendem que a melhor forma de evitar hospitalizações frequentes, especialmente durante os dois primeiros anos de vida, é a promoção de um ambiente ventilado, higienizado e sem o contato com pessoas doentes.
Minha filha prematura extrema de 23 semanas e 1 dia, mesmo recebendo todas as vacinas necessárias, incluindo a Palivizumabe- medicamento indicado para aumentar a proteção dos prematuros contra a infecção pelo vírus sincicial respiratório- foi liberada para a escola após os seus 3 anos de idade. Já o meu prematuro de 32 semanas, seguindo as mesmas orientações quanto a vacinas, após completar 2 anos. Pessoalmente, como uma mulher que sempre trabalhou fora de casa, nunca imaginei, antes de vivenciar os efeitos a curto e a longo prazo da prematuridade, que iria ter que abrir mão, temporalmente, de minha profissão. Como minha filha apresentava uma imunodeficiência significativa e problemas respiratórios e cardíaco que geravam um cuidado médico e clínico mesmo após a alta hospitalar, eu e meu marido optamos também por não termos babá, já que a nossa casa já estava sendo “ habitada” por vários profissionais de saúde do home care. Desejávamos cuidar e ter momentos com a nossa pequena sem a interferência de ninguém. Particularmente, eu precisava sentir que podia e conseguia cuidar da minha filha sozinha, mesmo com todas as características clínicas apresentadas.
Como mãe de 2 prematuros, afirmo que todas as transformações que a prematuridade impõe a nós pais, sejam elas pessoais, sociais ou profissionais, podem nos causar muita exaustão física e emocional. Não receber visitas, tardar a entrada do filho em uma escola, escolher ou não ter uma babá ou se ausentar de eventos socais e familiares são escolhas necessárias e orientadas pela própria equipe de saúde que acompanha as particularidades de nossos prematuros. Escolhas essas que não cabem julgamentos ou opiniões que não compreendem os efeitos a longo prazo da prematuridade para o desenvolvimento infantil e contexto familiar. Porém, posso afirmar também que apesar das dificuldades enfrentadas, aos poucos, nós pais de prematuros vamos percebendo o quanto é possível exercermos os nossos papéis pessoais, profissionais e sociais, além dos impostos pela maternidade e paternidade de uma criança que exige cuidados e atenção especial por um período maior de tempo. Afinal de contas, sermos mães e pais de prematuros não foi um desejo e nem uma escolha nossa. Mas como vamos lidar com toda essa realidade será, sim, uma escolha pessoal e familiar.