Por que a correção da idade é fundamental nos primeiros anos de vida dos prematuros? Coluna Vida de Prematuro da Revista Crescer

Olá a todos! Segue mais um texto na Coluna Vida de Prematuro da Revista Crescer sobre três aspectos importantes na trajetória de todo e qualquer prematuro: sobrevivência, crescimento e desenvolvimento.

Abaixo segue o link direto da Revista Crescer: https://revistacrescer.globo.com/Colunistas/Teresa-Ruas-Vida-de-Prematuro/noticia/2020/04/teresa-ruas-por-que-correcao-de-idade-e-fundamental-nos-primeiros-anos-de-vida-dos-prematuros.html ou logo abaixo, o texto na íntegra.

Texto na Íntegra

Não há como negar a imensa preocupação que todo pai de prematuro extremo, que tenha passado por muitas intercorrências clínicas e permanecido muito tempo hospitalizado, sinta sobre as etapas, o ritmo e a qualidade do crescimento e desenvolvimento global que o nosso filho apresentará após a alta hospitalar, não é mesmo?

Durante todos esses anos de experiência profissional e como mãe de 2 prematuros, venho percebendo que para os pais, várias preocupações e questionamentos podem aparecer não somente no momento em que seus filhos estão em Unidades de Terapia Intensiva, mas também em outros momentos como a primeira infância e a fase escolar. 

Questões como: ¨meu filho será sempre pequeno?¨,  ¨meu filho sempre terá dificuldade em adquirir peso?¨, ¨tenho que corrigir a idade do meu filho até quando?¨,   ¨ele terá sequelas neurológicas? ¨, ¨quando e como ele irá adquirir alguns marcos importantes do desenvolvimento infantil, como andar e falar?”, ¨ele conseguirá aprender?¨,  ¨ele conseguirá se alfabetizar?¨,  “entre outras dúvidas e angústias que vão aparecendo no dia a dia com os nossos prematuros.

Pessoalmente, diante do nascimento de minha primeira filha, por ser prematura extrema, diferentemente do meu segundo filho, minha preocupação inicial estava centrada em 3 aspectos: sobrevivência, crescimento e desenvolvimento.

Em relação à sobrevivência, o prematuro pode passar meses em um ambiente hospitalar para adquirir a tão sonhada estabilidade clínica. Experimenta agressões e invasões em seu pequeno corpo, como cateteres, tubos e sondas para garantir-lhe uma sobrevivência digna, sendo que alguns bebês precisam passar, inclusive, por procedimentos cirúrgicos. 

Em todo esse processo de hospitalização, o nosso bebê prematuro tem sensações difíceis, tais como as dolorosas, vivenciando situações muito diferentes das esperadas para um bebê a termo, como sentir a textura do nosso seio, o gosto do leite, o nosso cheiro, ter o contato pele a pele, sentir a temperatura da água do banho, ouvir os ruídos da nossa casa, perceber a textura da roupinha em seu corpo e receber e participar de muitas experiências afetivas e lúdicas com os seus pais e irmãos.

Especialmente o prematuro extremo, ao contrário, terá todas essas experiências de uma outra forma, em um outro tempo, obedecendo a um outro ritmo e a uma outra frequência. O contato com todas essas sensações/vivências que despertam o desejo, o bem estar e a curiosidade natural de toda criança pequena só podem começar após tão sonhada estabilidade clínica. E justamente, toda essa diferença de ‘exposição’, da qualidade, da quantidade e da maneira como os estímulos ambientais são oferecidos, recebidos e processados é uma das explicações do porquê os prematuros poderão ter outras características no decorrer do desenvolvimento, após a alta hospitalar e a longo prazo.

Em relação ao crescimento, mesmo que a equipe médica nos explique o quão normal é a perda de peso, especialmente nas 3 primeiras semanas de vida de nossos guerreiros, nós pais de prematuros nos angustiamos e muito com cada grama perdida nesse início da vida, não é mesmo? Afinal de contas, nenhuma mãe e nenhum pai está preparado para ter um filho tão pequeno e que ainda perderá mais quilogramas, transformando os nossos bebês em seres menores ainda.   

Nos grupos de acolhimento aos pais de prematuros, verifico que muitos deles, assim como eu, mesmo após a alta hospitalar, são traumatizados com a dificuldades que essas crianças enfrentam para crescer e ganhar peso. Alguém aí se identifica? Um dos aspectos que pode tranquilizar nós, pais, é saber sobre a correção da idade gestacional e que, frequentemente, a maioria dos prematuros extremos atinge sua curva de crescimento dentro dos padrões esperados até os 2-3 anos de idade. E você sabia que, geralmente, o “catch-up¨, palavrinha tão ouvida por nós pais e que significa a recuperação do crescimento, ocorre primeiro na cabecinha, seguido pelo comprimento e depois no peso? Sim, o tamanho da cabeça é o primeiro a se normalizar, antes mesmo do peso.

A idade corrigida traduz o ajuste da idade cronológica em função do grau de prematuridade que o nosso bebê apresenta. Ou seja, considerando que o ideal seria nascer com 40 semanas de idade gestacional, devemos descontar da idade cronológica do prematuro as semanas que faltaram para sua idade gestacional atingir 40 semanas. Portanto, idade corrigida é = idade cronológica- (40 semanas – idade gestacional em semanas). Para exemplificar o cálculo, vamos pensar em um bebê que atualmente está com 6 meses de idade cronológica e que tenha nascido com 26 semanas gestacionais: Idade Corrigida= 27 semanas (6 meses x 4.5 – valor médio de semanas por mês-)- (40 – 26 semanas)= 27-14= 13 semanas. Portanto, a idade corrigida são 13 semanas/ 3 meses (13: 4,5= 2.9).  

No começo, pode até parecer difícil fazer essa conta, mas depois ficamos fera! Justamente porque a correção da idade é de fundamental importância para todo e qualquer prematuro. A Organização Mundial de Saúde (OMS) e Academia Americana de Pediatria (AAP) demonstram a importância em corrigir a idade gestacional na avaliação do crescimento e do desenvolvimento até os 2 anos de idade, para que o pediatra e o pais tenham a expectativa real para cada criança, sem subestimar o prematuro ao confrontá-lo ou compará-lo com um bebê que teve o seu desenvolvimento intrauterino completo. Sendo que, embora ainda existam controvérsias, vários pesquisadores em prematuridade, tais como eu, recomendam corrigir a idade dos prematuros extremos até os 3 anos de idade.

Lembro-me claramente que quando minha filha, nascida de 23 semanas e 1 dia, saia para vacinar ou fazer o acompanhamento do seu desenvolvimento, eu sempre dizia às pessoas a sua idade corrigida e não a cronológica, justamente para evitar comentários, tais como: ¨nossa, como ele é pequena!¨, ¨nossa, como ela é magrinha!¨, ¨nossa, meu filho nessa idade já ficava sentadinho e durinho no sofá!¨, ¨nossa, será que ela não está atrasada?¨, ¨acho que ela precisa de terapia!¨, entre tantas outras frases absurdas que pais de prematuros podem ouvir ao longo do desenvolvimento de nossos filhos. Alguém aí se identifica?

Portanto, para uma correta avaliação do desenvolvimento a longo prazo de nossos prematuros- meu terceiro ponto de grande preocupação como especialista e mãe-, especialmente o neurológico, é fundamental a correção da idade em função da prematuridade nos primeiros anos de vida e um acompanhamento atencioso, especialmente na primeira infância.

Felizmente, existem muitos casos de prematuros extremos sem sequelas graves. Porém, mesmo assim, diante do período de internação e todas as necessidades apresentadas, podem, sim, apresentar outras características ao longo do desenvolvimento infantil, especialmente quanto à aquisição de alguns comportamentos/marcos específicos dos primeiros anos de vida e primeira infância. Mesmo que façamos a correção da idade gestacional, a qualidade e a frequência de alguns marcos/etapas específicas de cada idade podem se diferenciar quando comparamos os bebês a termo e os prematuros, especialmente os extremos.

Porém, pais de prematuros, acreditem também que as relações entre pais e filhos, aquelas bem permeadas por afeto, podem, a cada dia se fortalecer e permitir que os nossos bebês expressem as suas potencialidades e dificuldades. Dessa forma, poderemos, juntamente com o pediatra e/ou outro profissional da equipe que acompanha o seu filhote, pensar e colocar em prática diferentes estratégias do dia-a-dia que podem favorecer o desenvolvimento global e o acompanhamento das etapas previstas nos primeiros anos de vida, por meio de experiências ricas e saudáveis para pais e filhos. E não se esqueçam de conversar sobre todas as dúvidas que surgem ao longo do desenvolvimento de nossos guerreiros com o pediatra responsável.

Um grande abraço, com muito afeto, Teresa Ruas e Equipe @prematuros e prematuros.com.br

LUCCA NA UTI NEONATAL- ARQUIVO PESSOAL
LUCCA COM 2 ANOS DE IDADE

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